PL 2633 facilita a vida dos grileiros, diz deputado Vilson da Fetaemg

O projeto elaborado em substituição à MP 910 atende os interesses “dos grileiros, das pessoas mal intencionadas que atearam fogo na Amazônia e que estão desmatando, que grilaram terra e querem ganhar esta terra no grito”, denuncia o deputado federal Vilson Luiz da Silva (o Vilson da Fetaemg), que defende o arquivamento do PL.

“Neste momento devemos empregar toda nossa energia no combate à pandemia do coronarvírus”, observa o parlamentar mineiro do PSB em entrevista ao site.  Nesta quarta-feira (20) o Brasil amanheceu com a notícia de que, pela primeira vez, foram registradas mais de 1 mil mortes no país pela Covid-19.

Vilson da Fataemg é agricultor familiar, presidente da Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Minas Gerais e vice-presidente da CTB (Central Única dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil).

Uma vitória provisória

Batizada de MP da Grilagem a Medida Provisória 910, imposta por Jair Bolsonaro para favorecer os grandes proprietários, caducou na segunda-feira (19), fato comemorado como uma vitória pela oposição. O presidente da Câmara Federal, Rodrigo Maia, preferiu não encaminhar a votação da medida em função da saraivada de críticas que recebeu de ambientalistas e dos movimentos sociais. As centrais sindicais emitiram nota e dialogaram com parlamentares argumentando contra a aprovação da MP.

Mas a vitória não foi definitiva. Os porta-vozes dos grileiros, abrigados na chamada bancada ruralista, mudaram de tática mas continuam na ofensiva. Em substituição à MP 910 o deputado José Silva (Solidariedade/MG), que era o relator da matéria encaminhada pelo governo, elaborou o Projeto de Lei 2633. Embora mais brando do que a MP da Grilagem, o PL representa os mesmos interesses da medida que caducou. O deputado Marcelo Ramos (PL-AM) é o seu relator e a bancada ruralista não poupa esforços para apressar sua votação e aprovação.

Na opinião de Vilson da Fetaemg, “embora menos agressivo do que a MP 910, o PL 2633 merece muitos questionamentos”. A dimensão das áreas passíveis de regularização sem vistoria foi reduzida de 15 para seis módulos fiscais (tamanho das propriedades em hectares definido pelo Incra).

Porém, milhares de pequenos produtores rurais “não serão contempladas porque suas terras não têm títulos, não estão legalizados, vão ficar de fora”, sustenta o parlamentar mineiro, rebatendo a retórica de que a mudança visa favorecer os pequenos em detrimento dos grandes proprietários rurais.

Comunidades indígenas e quilombolas

“Eles mantêm a regularização pelo sistema remoto, sensoriamento por satélite, que nós não aceitamos porque se tem uma área em conflito, de comunidade indígena, quilombola, comunidade tradicional, se tem conflito agrário o sensoreamento remoto não vai perceber isto”, explica.

O deputado sindicalista critica a “dispensa da assinatura do confrontante no PL. Para nós é muito importante o confrontante da área dar uma declaração, uma certificação, porque ele conhece, tá ali do lado”

“Outra questão preocupante é a possibilidade de que terras do Incra passíveis de regularização, assentamentos, acabem se transformando em foco de grilagem”, assinala. “Vamos supor que em função da inoperância do Incra trabalhadores que foram assentados numa determinada área não suportaram por falta de infraestrutura básica, aí um outro que tem poder econômico entra com uma proposta e ocupa a área. Ele poderá com este PL ser regularizado, enquanto o trabalhador que enfrentou no passado o desbravamento daquele assentamento vai ficar de fora, vai ser prejudicado”. 

A regularização de propriedades com até 6 módulos rurais dispensa vistoria prévia, mas o deputado indaga: “como é que vai ser nas áreas em conflito? O sensoriamento remoto não vai enxergar isto”.

Sociedade contra grileiros

Outros pontos críticos enfatizados por Vilson da Fetaemg:

O PL permite uma permuta de área da União, que é área pública, por área privada, sem estabelecer nenhum critério, nós discordamos disto;

Autoriza celebração de convênios com cartórios de imóveis, bancos, correios e entidades e não cita uma só associação, um sindicato. Ora, cartório para fazer regularização fundiária vai beneficiar grileiros, banqueiros também vão favorecer grileiro e quanto aos Correios, empresa pública que todos nós prezamos, convenhamos que regularização fundiária não é tarefa para Correios;

O PL autoriza o Estado fazer leilão de áreas com até 2,5 mil hectares de terra e, tá lá no artigo 17, não tem critério e não fala sequer em licitação. Não é difícil imaginar nas mãos de quem estas terras vão cair, os grileiros estão felizes.

“Eu fiz parte da Comissão Mista que debateu a MP 910”, relatou o representante dos trabalhadores rurais na Câmara. “Pude constatar que as entidades de classe, ambientais, intelectuais, universidades, estão unidas contra os interesses dos grileiros”, sinal de que as forças mais conscientes da sociedade civil estão mobilizadas contra a grilagem. “Este PL nada mais significa do que facilitar a vida dos grileiros, das pessoas mal intencionadas que atearam fogo na Amazônia e que continuam desmatando, que grilaram terra e querem ganhar esta terra no grito”.

“Achamos prematuro votar de afogadilho uma matéria tão importante sabendo que não vai avançar para melhorar a geografia fundiária. Nós que representamos pequenos produtores não queremos que votem isto rápido e estamos lutando para o adiamento. Neste momento de pandemia nós temos a obrigação de votar apenas medidas de combate ao coronavírus e tirar da pauta os temas mais polêmicos. O Brasil já chegou ao terceiro lugar entre os que mais registram óbitos decorrentes do coronavírus no mundo”, finalizou. Na terça-feira (19) o país atingiu ultrapassou pela primeira vez a casa dos mil mortos (foram 1179), segundo dados do Ministério do Trabalho. 

Umberto Martins