Adeus, dólar. China e Brasil começam a descartar moeda estadunidense nas relações bilaterais

BEIJING, CHINA - MAY 15: (CHINA OUT) Dollars and yuan notes are seen at a bank on May 15, 2006 in Beijing, China. China's official exchange rate rose today to 7.9982 yuan per U.S. dollar, its highest level since a revaluation in last July, the government said. (Photo by China Photos/Getty Images)

Um dos objetivos do Brics, e dentro dele do Brasil, explicitado pelo presidente Lula, é livrar os países que compõem o bloco geopolítico, que foi ampliado em sua última cúpula, da dependência do dólar, moeda dos EUA que se tornou hegemônica no mundo após a Segunda Guerra, exercendo as funções de unidade de conta, meio de troca e reserva em quase todas as negociações internacionais.

Esta circunstância confere ao imperialismo ianque um privilégio exorbitante, conforme alertou em outra época um eminente político francês. Isto ficou mais claro com as sanções contra a Rússia. Mas, o uso do dólar como arma dos EUA na guerra geopolítica acionou o sistema de alarme na comunidade internacional e abalou a fé global na moeda emitida, às vezes de forma abusiva, por Washington e acelerou a busca de alternativas.

O Brics está agora orientado pelo propósito de desdolarizar as relações comerciais e financeiras no interior do bloco, realizando o intercâmbio com base nas próprias moedas. Passos relevantes neste sentido estão sendo dados, inclusive pelo Brasil, demonstrando que o dólar e sua posição de moeda global parece estar com os dias contados. Embora este processo demande anos, quem sabe décadas, para ser concluído, não restam dúvidas de que teve início e está em curso.

Carta de crédito em iuane

De acordo com informações divulgadas no início desta semana pelo Banco da China (Brasil), a instituição processou com sucesso o desconto de cartas de crédito em iune (RMB, moeda chinesa) para uma empresa brasileira, converteu a moeda chinesa em reais na hora e depositou na conta bancária da empresa. Isso significa que a China e o Brasil realizaram pela primeira vez uma operação de ciclo fechado completa que envolve a precificação, liquidação, financiamento e conversão direta de RMB.

A Eldorado Pulp é uma das empresas mais competitivas do setor de celulose no Brasil. Cerca de 40% de seus produtos são vendidos para a China. Em agosto deste ano, a empresa aceitou o pedido do importador chinês para usar RMB como moeda de denominação do contrato e designou o BOC Brasil como o banco beneficiário para testar a liquidação em RMB. Depois de receber a carta de crédito de pagamento diferido em RMB emitida pelo importador, o BOC Brasil executou o desconto de carta de crédito em yuans, permitindo que a Eldorado Pulp recebesse antecipadamente o pagamento em moeda chinesa.

Conforme os regulamentos brasileiros de gestão cambial, o BOC Brasil converteu imediatamente o RMB recebido em reais e os transferiu para o Brasil, enviando direto para a conta local do cliente. Tal processo propicia aos exportadores uma solução completa de liquidação em RMB, mostrando que o dólar é descartável.

A expectativa é de que outras empresas sigam este mesmo caminho. A tendência de desdolarização do comércio exterior tende a ganhar novos espaços ao longo dos próximos anos, tendo por pano de fundo o processo histórico de decadência do poderio econômico dos Estados Unidos no mundo e o deslocamento do poder industrial e geopolítico do Ocidente para o Oriente.