Refletindo a composição majoritariamente conservadora do Parlamento, a Câmara Federal, hoje presidida por Hugo Mota, optou por preservar os interesses mesquinhos dos especuladores ao derrubar o decreto do governo que alterou a alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), que no caso incidiria principalmente sobre operações de crédito para empresas, remessas internacionais, investimentos externos e operações cambiais diversas e não oneraria em um só tostão a imensa maioria da nossa sociedade.
Afinal, as estatísticas do IBGE indicam que 90% dos brasileiros ganham menos de R$ 3.500 e não têm como realizar remessas de divisas ao exterior, realizar investimentos ou mesmo viajar para fora do país.
O episódio revela a fragilidade da frente ampla que compõe o governo Lula e está bem representada no Ministério, mas é infiel, não garante os votos necessários para os projetos do Palácio do Planalto e no mais das vezes é hostil aos interesses do povo.
Neste caso, é preciso ressaltar que ao mesmo tempo em que desencadeiam uma guerra contra a mudança da alíquota do IOF, as forças reacionárias – hegemônicas na grande mídia – agitam o fantasma da “crise fiscal” para exigir o fim da política de valorização do salário mínimo, o arrocho do valor das aposentadorias e cortes nos investimentos em saúde e educação.
A conduta dos parlamentares que votaram pela derrubada do decreto presidencial não apenas denuncia a subordinação desses políticos (em geral identificados com a direita e a extrema direita), aos interesses dos ricos e poderosos, mas também constitui uma interferência indevida do Congresso no Executivo, usurpando poderes da Presidência e configurando uma violação do texto constitucional segundo o entendimento da Advocacia-Geral da União, que decidiu ingressar com ação no Supremo Tribunal Federal contra a decisão da Câmera dos Deputados, conforme relata a matéria reproduzida abaixo:
Por Danilo Vital
Ao editar um decreto legislativo para sustar a decisão de elevar a alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), o Congresso Nacional interferiu indevidamente na competência regulamentar do Poder Executivo e violou a Constituição.
É com essa alegação que a Advocacia-Geral da União pediu ao Supremo Tribunal Federal a suspensão e declaração de inconstitucionalidade do Decreto Legislativo 176/2025.
A ação foi ajuizada nesta terça-feira (1/7) e deve ser distribuída, por prevenção, ao ministro Alexandre de Moraes, relator de outras duas ADIs questionando a constitucionalidade dos decretos presidenciais que aumentaram o IOF.
A majoração da alíquota do imposto em operações de crédito para empresas, remessas internacionais, investimentos externos e operações cambiais diversas é necessária para que o governo federal complemente receita e atinja metas fiscais.
Ela foi feita pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) por meio dos Decretos Presidenciais 12.466 e 12.467, de 22 e 23 de maio de 2025, respectivamente. Já a derrubada pelo Congresso Nacional ocorreu na sexta-feira (27/6) e abriu nova crise entre o Legislativo e o Executivo.
Briga pelo IOF
Segundo a AGU, o decreto legislativo do Congresso é inconstitucional por violar o o artigo 153, inciso V e parágrafo 1° da Constituição Federal.
A norma confere à União a competência para instituir imposto sobre operações de crédito financeiras e alterar as alíquotas, desde que atendidos os limites e condições estabelecidos em lei — no caso, a Lei 8.894/1994.
Essa prerrogativa foi legitimamente exercida por Lula, de acordo com a AGU, o que faz com que a sustação dos decretos promovida pelo parlamento represente um caso de interferência do Legislativo no Executivo.
O órgão ainda contesta a justificativa legal usada no decreto legislativo, de que os decretos presidenciais violaram a lógica extrafiscal do IOF e serviram para mero aumento de arrecadação.
A AGU aponta que a expressão “extrafiscalidade” não está na Constituição e não serve como parâmetro objetivo de validade das leis e atos normativos. E que tributos dotados de caráter extrafiscal também têm função fiscal, servindo como fonte de receita.
“O IOF conserva a sua finalidade arrecadatória, mesmo que ostente um caráter extrafiscal eminente. O fato de as alterações das alíquotas impactarem positivamente as estimativas de receitas não denota desvio de finalidade, tampouco contamina a constitucionalidade do decreto presidencial”, diz a petição.
Limites da sustação
Por fim, a petição da AGU aponta a possibilidade de o Congresso sustar atos de outros Poderes não pode ser usada para limitação ilegítima ao exercício de competências atribuídas na Constituição.
Ou seja, ao avaliar o decreto de Lula sobre o IOF, caberia aos parlamentares decidir se houve algum abuso de competência regulamentar. Em vez disso, adentrou-se no mérito da decisão tomada sobre a alíquota.
“Estando o ato normativo adstrito às regras de distribuição de competências — independentemente do seu conteúdo — reputa-se indevido o uso do mecanismo previsto no artigo 49, V, da Constituição Federal”, sustenta a AGU.
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