Três desafios da luta dos trabalhadores

Foto: Freepik.

Todos esses avanços, porém, ainda são insuficientes diante das crônicas injustiças do Brasil e geram frustração na sociedade – conforme atestam pesquisas sobre a aprovação do atual governo. O golpe de 2016, a ascensão do neofascismo, o desmonte neoliberal e a pandemia da Covid, entre outras regressões, agravaram as contradições sociais no país e as mudanças em curso não garantem uma sensação de bem-estar à população.

Persistem as amarras que impedem um desenvolvimento econômico mais consistente com maior justiça social. A política de juros pornográficos do Banco Central “independente”, com a segunda maior taxa do mundo, inibe o crédito e o consumo, trava a produção e prejudica a geração de empregos de melhor qualidade e o aumento da renda.

Já o Novo Arcabouço Fiscal (NAF), que substituiu o famigerado Teto de Gastos de Michel Temer, ainda restringe os investimentos públicos em infraestrutura e programas sociais. Para destravar o crescimento da economia, garantindo maior impulso às mudanças, é urgente superar essas barreiras macroeconômicas.

Além disso, é preciso avançar nas mudanças estruturais no Brasil, implementando uma série de reformas – como a urbana, agrária, da saúde, do sistema financeiro, entre outras. Uma das reformas que ingressou na agenda política do país é a tributária, a partir da proposta do governo Lula de isentar do Imposto de Renda quem recebe até R$ 5 mil por mês, diminuir o tributo para quem ganha até R$ 7 mil e taxar em até 10% os rendimentos acima de R$ 1,2 milhão por ano.

A proposta beneficia cerca de 90 milhões de brasileiros com isenção total ou parcial e tributa apenas 141 mil super-ricos – um passo importante para a justiça tributária. Com mais essa iniciativa, o presidente Lula avança para cumprir um compromisso da sua campanha eleitoral – o de “colocar os pobres no Orçamento e os ricos no Impostos de Renda”.

Mudanças na economia e embates de ideias

Nesse cenário complexo – de melhora das perspectivas e de importantes avanços, mas também de muitas limitações e riscos de retrocessos –, quais são os principais desafios para a luta dos trabalhadores na atualidade? Pelo menos três se destacam.

O primeiro é o de isolar e derrotar o neofascismo no Brasil. Essa corrente, que hoje tem influência entre camadas dos explorados, prega o ultraneoliberalismo na economia, com o desmonte dos direitos sociais e trabalhistas; o autoritarismo na política, com golpes e ataques às organizações populares; e o obscurantismo nos valores civilizatórios, destilando ódio e preconceito na sociedade.

Não dá para vacilar diante dos fascistas, que seguem com força no mundo e no Brasil – aqui expresso pelo chamado bolsonarismo. É preciso enfrentá-los com coragem, sabedoria e amplitude nas ruas, nas redes sociais e nas urnas. A disputa eleitoral de 2026 será decisiva nessa jornada de importância tática e estratégica.

O segundo grande desafio é o de impulsionar o governo Lula no rumo das mudanças no Brasil. Como o próprio presidente já afirmou várias vezes, ele não precisa de bajuladores, mas sim de quem o critique e pressione – já que o seu governo sofre violento cerco do império decadente, do “deus-mercado”, do parlamento reacionário e da mídia rentista.

A ausência de avanços mais sensíveis à população serve de caldo de cultura aos neofascistas, para o seu retorno ao poder. O governo precisa destravar a economia com mais ousadia e enfrentar com mais coragem o debate de ideias na sociedade, ajudando a sua politização.

Quando o governo partiu para o enfrentamento na questão da justiça tributária, desnudando o choque entre ricos e pobres no país, e peitou o “imperador” Donald Trump e seus capachos no Brasil, os traidores da pátria na questão do tarifaço, ele saiu das cordas e voltou a crescer em popularidade.

É preciso persistir e avançar no caminho das mudanças efetivas na economia e no embate de ideias na sociedade. Por último, o terceiro desafio diz respeito à organização e à luta dos trabalhadores, ao papel do sindicalismo na atualidade.

Enfrentar as debilidades do sindicalismo

Nos últimos tempos, o movimento sindical tem enfrentado dificuldades para levar adiante a luta pelos interesses imediatos e futuros dos trabalhadores. Os obstáculos são visíveis em todos os países – e não apenas no Brasil – e atingem todas as correntes de opinião que atuam nessa frente estratégica.

Eles decorrem de fatores objetivos, que afetam a materialidade de classe dos assalariados, fruto das novas tecnologias e das profundas mudanças no mundo do trabalho. Também derivam de retrocessos políticos no capitalismo mundial, com a ascensão do neofascismo.

No Brasil, o golpe do impeachment de Dilma Rousseff e a chegada ao poder do bolsonarismo resultaram em violento ataque ao sindicalismo e aos direitos trabalhistas. Fruto dessas regressões, a taxa de sindicalização segue caindo no país – era de 24% na década de 1980 e hoje é de apenas 8,4% da População Economicamente Ativa (PEA). A força política dos trabalhadores também regrediu – em 2010, o sindicalismo elegeu 83 deputados federais; em 2022, conquistou só 34 mandatos.

Com a nova perspectiva aberta com o governo Lula, a luta dos trabalhadores tem melhores condições para retomar seu fôlego e ganhar maior musculatura. Além da luta para superar os entraves neoliberais na economia e para avançar nas reformas estruturais, o sindicalismo pode se fortalecer com suas pautas mais específicas – como a luta pela revisão das “deformas” trabalhista e previdenciária dos governos Temer e Bolsonaro, contra a precarização e a “uberização” do trabalho, entre outras.

Em unidade com os movimentos sociais, o sindicalismo também pode reforçar a pressão política no país, como demonstrou o Plebiscito Popular sobre o fim da desumana escala de trabalho do 6 x1 e sobre a taxação dos super-ricos, organizado pelas frentes Brasil Popular e Povo sem Medo e pelo Fórum das Centrais Sindicais. Com mobilização, conscientização e organização, o sindicalismo terá papel decisivo na luta por democracia, desenvolvimento econômico e justiça social.

* Este artigo tem como base a contribuição ao debate no 11º Congresso do Sintaema (Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente de São Paulo), realizado no final de outubro.

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