O funcionamento ininterrupto de empresas e serviços — como hospitais, siderúrgicas, energia elétrica, vigilância e transporte — impõe a milhares de trabalhadoras e trabalhadores jornadas em horários e dias não usuais, com grande desgaste físico e mental. A Constituição Federal de 1988 reconheceu esse impacto e garantiu a esses profissionais o direito a uma jornada reduzida de seis horas diárias, mas o que deveria ser uma conquista consolidada vem sendo enfraquecido por interpretações distorcidas e decisões judiciais que restringem o alcance do direito.
Em artigo publicado no Dossiê Fim da Escala 6×1 e Redução da Jornada de Trabalho, o economista e pesquisador Carlindo Rodrigues de Oliveira analisa os avanços, retrocessos e incompreensões em torno do trabalho em turnos ininterruptos de revezamento e denuncia as tentativas de flexibilizar um direito constitucional.
Segundo o autor, há dois equívocos predominantes no debate jurídico e sindical: o de que o revezamento só se caracteriza quando há alternância de horários entre equipes, e o de que trabalhar em turnos fixos seria mais benéfico aos trabalhadores. Carlindo refuta ambos os argumentos, mostrando que a alternância é, na verdade, um mecanismo de equilíbrio, que reparte entre as equipes o desgaste das jornadas noturnas e dos horários irregulares.
“Fixar os turnos pode até ser mais cômodo para quem trabalha de manhã, mas é extremamente prejudicial para quem fica preso permanentemente aos turnos vespertinos ou noturnos. A alternância é uma forma de dividir o ônus da penosidade”, explica o autor.
O estudo mostra ainda que, com a Constituição de 1988, as empresas passaram a adotar o sistema de cinco equipes de revezamento, reduzindo a carga semanal média de 42 para 33,6 horas semanais, sem prejuízo da produção. Essa conquista, porém, vem sendo corroída por acordos coletivos e decisões judiciais que interpretam de forma equivocada a expressão “salvo negociação coletiva”, permitindo que empresas eliminem a quinta equipe e ampliem as horas trabalhadas.
Carlindo alerta que tais interpretações violam o texto constitucional, pois a negociação coletiva não pode reduzir ou anular direitos assegurados pela Constituição. “O cerne do direito é a redução do tempo de trabalho, e não a forma de sua aplicação. A negociação pode definir a escala, mas jamais eliminar o benefício”, afirma.
O autor também destaca a “Escala Francesa”, modelo de revezamento com cinco equipes e alternância de horários, que proporciona maior tempo de folga e é considerado pelos trabalhadores o mais equilibrado em termos de saúde, descanso e convívio familiar. O formato foi defendido, por exemplo, pelos metalúrgicos de Ipatinga (MG) em 2010, que denunciaram os efeitos nocivos dos turnos fixos sobre a saúde e a vida social.
“A manutenção do turno fixo é uma agressão à saúde e à qualidade de vida. Só o revezamento justo permite que o trabalhador viva para sua família e participe efetivamente da sociedade”, dizia o boletim do Sindicato dos Metalúrgicos de Ipatinga citado no texto.
Ao final, Carlindo reforça que a garantia da jornada reduzida em turnos ininterruptos depende da mobilização coletiva dos trabalhadores e de uma urgente revisão das interpretações jurídicas que vêm enfraquecendo essa conquista.
“A luta pela jornada reduzida continua sendo essencial para a saúde, a segurança e a dignidade de quem mantém o país funcionando 24 horas por dia”, conclui o autor.
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