As estatísticas sobre o comportamento do emprego em janeiro, divulgadas nesta sexta pelo IBGE, revelam um avanço de 20,6% no número de desempregados nas seis regiões metropolitanas pesquisadas pelo instituto (Porto Alegre, São Paulo, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Salvador e Recife), que totalizou 1,9 milhão. Registre-se que, diferentemente do Dieese, a estimativa do IBGE só abarca os chamados desempregados diretos, ou seja, quem procurou emprego ao longo dos últimos 30 dias, excluindo o demitido, que por desalento ou qualquer outro motivo, desistiu de procurar um novo emprego. Na quinta (19), a Embraer surpreendeu o movimento sindical e até o presidente Lula ao anunciar a demissão de 4,2 mil trabalhadores e trabalhadoras.
Notícias inquietantes
Outras notícias inquietantes dizem respeito ao comportamento das receitas governamentais e ao front externo. A arrecadação de impostos e contribuições por parte da União caiu 10% em janeiro, o que o governo atribui às desonerações tributárias realizadas para combater a crise, mas o declínio certamente reflete também a desaceleração econômica. Em compensação, o superávit primário recuou (72% em relação ao mesmo mês do ano passado), o que sinaliza aumento dos gastos e investimentos públicos. A decisão de reduzir o superávit é bem vinda neste momento de crise. De todo modo a queda da arrecadação reduz a capacidade do governo ampliar gastos e investimentos para sustentar a demanda doméstica.
Os números do balanço de pagamentos também não são nada bons. Janeiro terminou com uma queda de 60% nos Investimentos Diretos Externos (IDE) em relação ao ano passado. Os ingressos líquidos neste item somaram 1,9 bilhão de dólares. O balanço de pagamentos como um todo (que compreende os resultados da conta de capitais e das transações correntes) fechou o mês com déficit de US$ 2,2 bilhões, configurando um quadro de crescente deterioração das contas externas.
Reservas em queda
Os números do balanço de pagamentos despertam preocupações em dois planos. Os investimentos diretos provenientes do exterior constituem parte significativa dos investimentos internos realizados pelas empresas na expansão da economia nacional, portanto a queda das inversões estrangeiras nesta modalidade deprime a taxa geral de investimentos – que já anda baqueada, como podemos deduzir pelo forte declínio da produção de bens de capitais (máquinas e equipamentos) em janeiro (-24%). Os investimentos são a principal força motriz do crescimento econômico e quando declinam comprometem a expansão do PIB e do emprego em curto e médio prazo.
Não menos importante é o reflexo da deterioração das contas externas sobre as reservas internacionais e a capacidade do país resistir à crise. O recuo dos investimentos diretos do exterior, associado à escassez de crédito no mercado financeiro mundial e ao potentoso déficit na conta de rendas e serviços da conta corrente, produz um resultado negativo no balanço de pagamentos cuja cobertura exige a queima e redução das reservas internacionais. Por enquanto, as reservas ainda estão em nível confortável. Somaram 200,8 bilhões de dólares em janeiro, mas já registram “diminuição de US$ 6 bilhões frente ao apurado no mês anterior”, segundo informações divulgadas sexta (20) pelo Banco Central.
Desemprego, o maior problema
O agravamento do quadro no front externo confere maior atualidade à reivindicação apresentada ao por muitas lideranças dos movimentos sociais de estabelecer um controle mais rigoroso do fluxo de capitais e do câmbio (onde o dólar continua em alta), assim como a imposição de taxas e restrições às remessas de lucros e dividendos e outras rendas de capital, que embora caindo (como seria de se esperar em épocas de crise) ainda importam em valores expressivos. As remessas líquidas de rendas para o exterior somaram US$ 2 bilhões no mês, segundo o BC.
O dado mais significativo da crise diz respeito à evolução do emprego, não só do ponto de vista da classe trabalhadora, para a qual o corte de postos de trabalho é um flagelo, mas igualmente para a chamada macroeconomia. A queda do emprego e do número de horas trabalhadas traduz queda de produção e não só deriva da crise como também a impulsiona. O desemprego reduz a produção e também o consumo, alimentando a recessão. As estatísticas do IBGE mostram que os ramos mais atingidos pelas demissões em janeiro foram o comércio (que até então não tinha sentido os efeitos da crise) e a construção civil.
A conduta do governo Lula diante da crise difere substancialmente da orientação neoliberal de seus antecessores, sobretudo FHC. Em vez de maiores restrições fiscais e monetárias, o presidente determinou a ampliação dos investimentos públicos, sobretudo no PAC, a continuidade da política de valorização do salário mínimo, a expansão do crédito, embora prevaleça o conservadorismo na política econômica. Isto foi decisivo para que o Brasil não fosse atingido tão duramente pela crise como em outras ocasiões do passado.
Todavia, falta muito por fazer e, por mais desejável que seja, é cedo ainda para dar adeus à crise. A boa vontade do Estado, e mesmo iniciativas positivas (ainda que tímidas), não bastam para deletar os problemas. O Brasil, como a China e outros países, sofre os efeitos de uma crise internacional pela qual tem pouca ou nenhuma responsabilidade e cujo contágio é inevitável em função da globalização do processo de circulação do capital. As notícias da semana indicam que a crise também não alcançou o fundo do poço nos Estados Unidos, no Japão (que ingressou na pior recessão de sua história, registrando queda da produção industrial superior a 12%) ou na Europa. Muito pelo contrário. Se as coisas vão mal lá fora não devemos esperar que melhorem muito por aqui.
Umberto Martins é editor do Portal CTB