TARTUFOS 2 – Governança: explicação subliminar para uma ditadura imperial

Martha Martinez Navarro
Se a classe trabalhadora, os sindicatos e a principais instituições do direito trabalhista sofreram golpes escalonados com o neoliberalismo, também foram introduzidas de forma sincronizada outras ações normativas em alguns ramos dos sistemas jurídicos nacionais, buscando estimular a inversão estrangeira de capitais e a privatização de empresas de setores estratégicos da indústria dos serviços públicos.

O rigor na aplicação do neoliberalismo não foi similar para as nações e regiões. Em muitos países da América Latina, as empresas transnacionais estadunidenses e europeias receberam privilégios, garantias e imunidades ilimitadas que favoreceram a exploração desenfreada das riquezas e da mão-de-obra latino-americanas; tanto que nos países desenvolvidos ocorreu a impressionante onda de imigração procedente dos antigos Estados socialistas do Leste europeu, da América Latina e da África.

Por outro lado, a transnacionalização de importantes setores da produção e dos serviços, dos bancos, das comunicações e da informação, requereu, sem dúvida, reformas no ordenamento jurídico, necessárias para instalar pautas liberais utilitárias ao crescimento do capital e que adicionalmente criaram regulamentações que, no âmbito de cada nação, entorpeceram o processo de construção de um governo mundial sólido e onipotente.

O governo mundial imperialista esboçado e composto desde a década de 1950, inspirado pelos “cérebros do império” com discussões de opinião e voto no “Council on Foreign Relations”, o “clube Bilderberg”, “o Word Economic Forum”, o Instituto Francês de Relações Internacionais (IFRI), a “Trilateral Commission”, o “Clube de Roma”, os Iluminatis e outras mentes liberais acostumadas a alicerçar seus ideais por meio do dinheiro.

A ideia, apesar de não ser nova, explodiu como pólvora no mundo, penetrando na linguagem escrita e oral dos organismos multilaterais, instituições financeiras, organizações sindicais, coordenações regionais e movimentos sociais, sempre associada à necessidade de instaurar uma nova ordem mundial e humanizar a globalização.

Pela transcendência que a chamada governança global sobre os trabalhadores e o movimento sindical, aprofundaremos esta questão.

Conceber a governança mundial a partir da democratização das instituições multilaterais, garantindo a participação, colaboração e influência equivalente de todos os seus Estados-membros é, de fato, uma pretensão racional. Sem dúvida insistir nisso e, o que é muito mais grave, relevar este propósito sem considerar as condições que prevalecem no presente no cenário internacional, significaria patrocinar a instalação de uma tirania mundial sombria e mascarada.

Entre os primeiros elementos a serem avaliados para a sustentação deste critério está o pensamento capitalista expresso através do tempo, do qual citamos alguns exemplos.

Nicholas Murray Butler, educador, filósofo e político estadunidense, membro do conselho para as Relações Exteriores e do Partido Republicano expressava na primeira metade do século passado:

“O mundo se divide em três categorias de pessoas: um número muito pequeno que produz acontecimentos, um grupo um pouco maior que assegura sua execução e observa como acontecem e, por fim, uma ampla maioria que nunca sabe o que na realidade aconteceu..”

Outra opinião que anuncia as verdadeiras intenções dos Estados Unidos na política internacional é a de Paul Warburg [1], expressada em 17 de fevereiro de 1950 no Comitê de Assuntos Externos do Senado dos EUA.

“Teremos um governo mundial, quer isto agrade ou não, a única questão será saber se será constituído por conquista ou por consentimento.”

Já neste século, em 9 de dezembro de 2008, Gideon Rachman [2] defendia em sua coluna do The Financial Times, a conveniência de estabelecer um governo mundial e, um ano mais tarde, George Soros ([3]) redundava o mesmo propósito com uma proposta afim com sua vocação especuladora, a qual foi duramente criticada por sua essência financeirista [4].

Por outro lado, Renaud FRANCOIS, investigador associado ao European Strategic Intelligence and Security Center (ESISC) de Bruxelas, criou o índice de governança global definindo indicadores para avaliar, medir e influir na governança mundial.

Destes mesmos focos nevrálgicos surgiram as teses econômicas neoliberais, muitas das medidas que hoje se aplicam para a gestão da crise e também as que procuram frear as lutas em favor da mudança; são os pilares de uma ordem mundial concebida para fragmentar e oprimir os povos e escamotear as riquezas das nações.

O historiador José Miguel Arrugaeta, em um artigo publicado em 2007, sob o título de “A crise da divisão do mundo – made in USA” defendia:

“A nova direita norte-americana vinha gestando desde há décadas uma política baseada no critério de que o mundo deve ser repartido de acordo com a força de cada qual e sua capacidade de liderança, evidentemente referindo sempre a o a mesma e todo o obstáculo que se apresentar deve ser o eliminado ou não ser levado em conta”. [5]

As referências mencionadas expõem o ideal imperialista de estruturar um poder situado acima das nações, dos Estados e dos cidadãos, ou seja, um governo global imperialista e não uma governança sustentada no princípio da cooperação entre as nações.

Este é o ideário dos guardiães imperialistas.

Transnacionalização e Dissonâncias da multilateralidade

Outro fator a considerar em torno da possível orientação de uma governança global é a presença e influência das empresas transnacionais no mercado mundial. Estas, repartidas em filiais por todas as regiões do planeta e com maior presença nas que concentram valiosas riquezas naturais, mantêm seu centro de comando, a nacionalidade de origem em países desenvolvidos para onde vão seus generosos lucros.

A subordinação dos governos do terceiro-mundo aos interesses das empresas de capital estrangeiro e suas limitações para exercer um controle efetivo sobre as condições da economia de mercado indicam que as normas, o conteúdo e a forma da governabilidade mundial responderiam à mesma submissão, o que seria consequência lógica da política imperialista aplicada aos países pobres, que não lhes deixa outra alternativa ou via de saída que não a dependência.

Hoje muitos Estados neoliberais continuam funcionando com morosa virtualidade subscrevendo os princípios da democracia, da constitucionalidade, da separação de poderes e do império legal. Entretanto, na realidade, as instituições e seus poderes legislativos, executivos e judiciais carecem de autoridade e autonomia para decidir o destino de suas nações.

Outro fator a avaliar na conformação de um governo global é a intervenção oficiosa dos organismos multilaterais e o fortalecimento de seu papel no delineamento e supervisão das normas globais a serem respeitadas pelos Estados nacionais e seus cidadãos.

Pressionados pelo estímulo dos movimentos sociais e sindicais, os organismos multilaterais adequaram seu discurso, na década de 1990, e reconheceram então o aumento da pobreza a de situações extremas e a intensificação das desigualdades, defendendo, porém, com a veemência e irreversibilidade da globalização e do livre mercado, o que apenas demanda, em sua opinião, a incorporação da dimensão social para que seja mais justo, sem reconhecer que isso negaria a própria natureza do capitalismo.

Nos nove anos deste terceiro milênio, estes organismos estenderam a entronização da humanidade na era dos pactos, dos acordos, das convenções, das declarações e das ‘políticas’, sem que os compromissos assumidos fossem cumpridos em torno do destino das nações, mudada a conduta dos ricos ou exigido o respeito aos direitos humanos fundamentais, ou que fossem reportados benefícios aos milhares de milhões de pobres que habitam o planeta.

O Pacto Mundial da ONU em 1999, a Declaração do Milênio adotada em 8 de setembro de 2000, o Programa de Trabalho Digno impulsionado pela Conferência Internacional do Trabalho de 1999, a Declaração sobre a justiça social para uma globalização equitativa da OIT aprovada em 2008 e o Pacto Global sobre o Emprego proposto por esta organização ao G -20, em setembro passado, são exemplos de uma estratégia que recria, sem sucesso, o conteúdo essencial da Declaração Universal de Direitos Humanos – aprovada e vigente desde 1948 – que, de toda a forma, deve ser atualizada para proteger o homem dos novos riscos como, por exemplo, a sua posição ante os descobrimentos científicos e tecnológicos e os riscos ambientais, sua repetição no texto de novos instrumentos internacionais só conduz a alimentar esperanças nos desesperados e estabelecer confiança no sistema.

Se os princípios que inspiraram a criação da Organização das Nações Unidas e as normas do Direito Internacional prevalecessem nos nossos dias, essencialmente as relações de cooperação internacional para a solução de problemas econômicos, sociais, culturais ou humanitários, o respeito aos direitos e liberdades fundamentais e a paz, sem dúvida, este organismo poderia ser a garantia dessa governança que se pondera. Todavia, a Organização das Nações Unidas, sendo a mais significativa delas, apesar de ser um organismo criado pelos Estados, não é controlado por o eles.

Ao ambiente global das relações internacionais é de superioridade e dependência e, na nossa época, esta submissão aumenta com o concurso das mais significativas organizações multilaterais. São elas que fixam as regras da economia de mercado e do comércio mundial com estandartes sociais, trabalhistas e ambientais reduzidos, observando de soslaio as condições geopolíticas de cada país determinadas por seu desenvolvimento econômico, social e político, sua participação no mercado, a estrutura da sua economia, seus recursos naturais, sua capacidade produtiva instalada, o espaço geofísico que ocupa e inclusive as tradições de seus povos.

A OCDE, a Organização Mundial do Comércio, o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Mundial (BM), a Comissão Europeia, o Banco Central Europeu, a OIT e outras instituições são, definitivamente, os instrumentos da política imperialista contemporânea; já foi assim durante mais de três décadas de neoliberalismo e continua sendo hoje, seu papel é o de coadjuvantes do pretendido governo supracitado.

Afinal, cada uma destas organizações executivas ou cooperantes, angariou nos últimos anos um poder intrínseco, para defender os interesses e garantir a ganância das empresas multinacionais em detrimento dos interesses nacionais e com desprezo às instituições e sistemas de direitos vigentes para o desenvolvimento da atividade econômica, comercial e financeira, de proteção ao trabalho e ao meio-ambiente.

Felizmente muitos destes organismos perderam a confiança e a credibilidade, entre o eles a Organização Mundial do Comércio que clama desesperadamente para concluir a empatada Rodada de Doha e aprofundar o livre comércio, e o Fundo Monetário Internacional, o Banco Mundial e as demais instituições financeiras que são reconhecidas como instrumentos econômicos dos Estados Unidos e de seus poderosos aliados.

OIT, Garantia de que?

Dado o impacto que as ações da OIT têm sobre os trabalhadores, é preciso refletir sobre o papel que esta Organização vem desempenhando como sujeito colaborador do sistema capitalista em seu propósito de calibrar o sistema e constituir um governo e um direito supranacional.

Há dois anos, o artigo DA GLOBALIZAÇÃO NEOLIBERAL À GLOBALIZAÇÃO DA HIPOCRISIA comentava:

“É inegável que o brutal reajuste capitalista neoliberal alcança a OIT e que a abstenção de sua função normativa nos últimos anos vem sendo motivada pela resistência dos Estados membros, em geral os mais poderosos, de trasladar ao texto de convênios vinculantes questões concernentes à relação jurídico-trabalhista que constituem um lastro para a expansão do capital e a liberdade de mercado” [6]

Esta circunstância provocou, em seu momento, críticas sobre sua falta de operacionalidade para incidir e frear os efeitos do neoliberalismo, surgindo critérios diversos; uns exigiam maior dinamismo ou defendiam sua democratização e outros pediam sua dissolução.

Lidando com estas posições, a OIT conseguiu aprovar em 1998, após calorosos debates, a Declaração de Princípios e Direitos Fundamentais privilegiando 8 convênios internacionais, com a intenção de fixar um marco de proteção mínima aos trabalhadores, conhecido como DIREITOS FUNDAMENTAIS que devem ser respeitados, mesmo não tendo sido ainda ratificados por um Estado Membro.

Um ano depois, em 1999, a organização começou a difundir a noção de “trabalho digno” reconhecendo que a globalização havia condicionado o desenvolvimento assimétrico, acentuando a vulnerabilidade e que as reformas neoliberais não haviam contribuído para a geração de empregos, mas apenas para deteriorar a qualidade do emprego existente.

Ainda que o programa proponha objetivos justos, com dimensões e componentes estimáveis, a proposta não se qualifica como alternativa viável para com diminuir os efeitos da globalização neoliberal. Contrariamente sua entrada no cenário internacional acontece para sufocar as mais genuínas expressões das lutas operárias e dos movimentos sociais.

As limitações dos programas de trabalho digno são percebidas tanto no enfoque conceitual como nos métodos e fórmulas que propõem, entre estes, vale destacar as seguintes:

Pretendem vincular as políticas de mercado às leis trabalhistas, combinando a flexibilidade nas empresas com a segurança e a proteção aos trabalhadores, ignorando, desta forma, as contradições entre o capital e o trabalho.

Exaltam o diálogo social, desconsiderando que a incompatibilidade de interesses impede assumir acordos eficazes para os trabalhadores que se apresentam ao diálogo em condições de desigualdade.

Mantêm a supremacia do livre mercado concebido para satisfazer os interesses reprodutivos do capital e não se propõem a frear a intemperança das transnacionais, uma questão tratada com luvas brancas, como o demonstra a Declaração Tripartite de Princípios sobre as Empresas Multinacionais, aprovada por este organismo no ano de 2000. [7].

Os direitos fundamentais que privilegiam excluem o direito básico à estabilidade trabalhista, dada à sua incompatibilidade com as leis do mercado.

O projeto que já tem 10 anos foi estendido por regiões e países com um desdobramento milionário de recursos para a capacitação, sem reportar benefícios nem melhora concretas aos trabalhadores não classificados e excluídos.

Os discursos anti-neoliberais, os diagnósticos situacionais e as propostas para tirar a humanidade da hecatombe não modificaram os indicadores de pobreza, fome, desemprego e as exclusões sociais, que continuaram crescendo, contradizendo os princípios de fundação da OIT que vinculam a justiça social à paz. Agregando-se a estes surgiram outros problemas derivados da crise ambiental, energética, alimentar, ética e social, até a explosão da crise imobiliária e financeira nos Estados Unidos em 2008, que veio coroar o modelo imposto que evidencia cada vez mais sua incapacidade de dar resposta às necessidades da humanidade.

Ardilosamente o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional, a Organização Mundial do Comércio e as instituições comerciais e financeiras da União Europeia fortaleceram-se nos direitos fundamentais e nos programas de Trabalho Digno para aplicar sanções, suspender privilégios comerciais ou, como condicionante, para conceder ou negar empréstimos e financiamentos às nações pobres ([8]), enquanto que os empresários, principalmente os de importantes corporações transnacionais, os incluíram em programas de Responsabilidade Social Empresarial.[9]

Esta chamada responsabilidade social (empresarial ou corporativa) é implementada relegando as organizações sindicais de base e em não poucas ocasiones consegue debilitá-las, manipulando aos trabalhadores com ações de suborno a fim de que prescindam e rechacem a filiação sindical. Permite ações e possibilita aumentos salariais seletivos, entre outros prêmios, para corromper os trabalhadores e patrocina campanhas humanitárias assegurando que suas dádivas sejam amplamente divulgadas e que se revertam num fator multiplicador de ganâncias ou de espaços de influência. Na prática se fomenta a divisão dos trabalhadores e a aplicação de políticas anti-sindicais.

Os códigos de condutas subscritos entre as grandes empresas e as multinacionais para o domínio em escala global, cerceiam, ainda mais, a função pública dos Estados e colocam na mão de sujeitos com poder econômico a responsabilidade de dar uma dimensão social à globalização.

Das circunstâncias expostas, é notável a trama preparada pelos organismos multilaterais, com o beneplácito de alguns líderes do movimento sindical internacional, para impor um sistema jurídico de direito supranacional, no qual os direitos fundamentais, longe de assumirem níveis mínimos de proteção, se fixam como arquétipo global, com franco desacato ao Inciso 8, do Artigo 19 da Constituição da OIT que impede o uso das normas da Organização como modelo trabalhista internacional.

Esse desvio pode induzir os governos a descartarem as instituições do direito trabalhista contempladas em suas legislações de trabalho, ou ainda motivar uma segunda onda de reformas que refreie unicamente os direitos fundamentais do trabalho, assimilados inclusive como direitos do tipo social. Desta forma, o direito trabalhista estaria definitivamente enterrado como um ramo independente do ordenamento jurídico e mutilada a competência normativa dos estados nacionais nesta questão.

Crise capitalista: Diabólicos cantos das sereias

As declarações finais das três cúpulas do G-20 demonstram que a crise é gestada em sua dimensão econômico-financeira para recuperar o equilíbrio, revalorizar o capital, a acumulação, fortalecer a banca e salvar o sistema capitalista. No entanto, a reunião de cúpula realizada em Pittsburgh, EUA, acrescentou o corroído compromisso de assegurar o crescimento global com benefícios para todos. Para convencer – dizem – implementaram as medidas anti-crise correspondentes aos princípios da OIT, ouvindo as demandas dos trabalhadores, criando novos empregos e colocando o trabalho de qualidade no cerne da recuperação.

Este pronunciamento, incorporado à tentativa de atenuar o crescente descontentamento dos trabalhadores e povos, não indica vontade alguma de reordenar a economia internacional com perspectivas e vontade coletiva na busca do entendimento e de relações de colaboração entre as nações do planeta. Pelo contrário, suntuosamente, os acordos internacionalizam a persistência dos países mais ricos em renovar com novos ares a expansão de capitais, de maneira a assegurar o controle e a dominação sobre as nações pobres (governos, pessoas e recursos), para a implementação técnica dos acordos designados às opressivas instituições financeiras (BM e FMI) que, em colaboração com a Organização Internacional do Trabalho, disponibilizem o que considerem “procedentes” em prol do trabalho digno.

Contam também com o respaldo da OMC, da OCDE, da Comissão Europeia, com um segmento do Movimento Sindical Internacional empenhado me reivindicar os direitos e não em lutar contra o capitalismo, utilizando, habitualmente meios de comunicação encarregados de formar estados de opinião e alimentar esperanças de recuperação.

Enfim, as soluções propostas pelo G-20 não tentam resolver as contradições estruturais da economia mundial.

O desembolso de bilhões de dólares para salvar os bancos e estimular a produção e o consumo não serviu para reverter substancialmente a situação, mantendo a instabilidade dos mercados financeiros, a eliminação de postos de trabalho, a falência de empresas produtivas, o aumento de preços de produtos alimentícios, da energia, o desmantelamento dos sistemas de proteção e seguridade social, a perda dos fundos de pensão, os arrochos salariais, a restrição de créditos para o consumo de bens, entre outras consequências que recaem violentamente sobre as vítimas e não sobre aqueles que as causam.

A rapidez e frivolidade das sessões realizadas em Washington, Londres e Pittsburgh, contrastam com a grave situação que a humanidade enfrenta, derivada da crise alimentícia, energética, ambiental, da educação, da saúde, do emprego e da pobreza generalizada e impossível de ser contida.

Esta situação desanda também com a universalização da injustiça, a expansão da xenofobia e os ataques raciais; os conflitos e fragmentações internas nas sociedades e famílias que padecem com a dependência de drogas, o alcoolismo, a delinquência e a deterioração geral dos valores éticos e morais dos indivíduos. Males esses inerentes ao capitalismo que, para ratificar o prejuízo à raça humana, fecha os olhos à irreverência e arrogância dos Estados Unidos de levarem a guerra a qualquer parte do mundo em sua cruzada oportunista contra o terrorismo.

Não fizeram nem uma única referência a questões transcendentais como a dívida externa, o despotismo das empresas transnacionais e a responsabilidade do governo norte-americano e seus aliados com esta crise. Poderia esperar-se algo diferente de uma reunião dos maiores responsáveis?

As reuniões de cúpula do G20 e as ações posteriores de suas instituições auxiliares deixam claro que o poder de superioridade e coação do cenário global continua nas mãos dos governos ricos do hemisfério norte e das grandes transnacionais e a tentativa de mudança enganosa de imagem é utilizada para levantar barreiras comerciais, quebrar ainda mais os países subdesenvolvidos, frear o avanço e o desenvolvimento de países emergentes ou em vias de desenvolverem-se e nunca em benefício dos trabalhadores.

Acompanhar com expressões triunfais os acordos do G-20 e as decisões das instituições financeiras internacionais identificadas por suas práticas antidemocráticas é encobrir e proteger os responsáveis pela crise e entrar no seu jogo como peça coringa, útil para manipular e desmobilizar o movimento operário e os povos.

Ante tal crise, o imperialismo se ampara na multilateralidade representada pelo Banco Mundial, o FMI, a OMC e a OIT para impor as decisões comerciais, econômicas, financeiras e sócio-trabalhistas que funcionam no sistema.

A decisão no marco da Reunião de Cúpula de Pittsburgh de acolher O Pacto Global sobre o emprego [10] e o Programa de Trabalho Digno foi interpretada por alguns como uma “vitória transcendental”, todavia seu objetivo não foi outro senão “simular e enganar” para aplacar a desconfiança e disseminar conscientemente, em nós que padecemos com os efeitos mais cruéis e diretos da crise, a esperança em uma pronta e segura recuperação econômica que trará a solução para os grandes males sociais que a humanidade vem sofrendo.

A OIT, encarregada de velar pelo cumprimento de sua fecunda normativa internacional, e as organizações sindicais que aplaudem esta falsidade ou que a validam com sua atuação, ficam atreladas aos interesses capitalistas representados pelos países do G-20, os bancos e o setor empresarial.

Desta forma, os fins e objetivos para os quais a OIT foi criada estão sendo transfigurados em um programa virtual enquanto que, na prática, a organização não estaria favorecendo o consenso entre governos, sindicatos e empregadores, mas ao lucro depredador da cúpula imperial e seu objetivo último: constituir um regime acima dos Estados-Nações.

Quanto à fração do sindicalismo que de fato acompanha cada jogada dos poderosos, diríamos que a sua insistência nesta posição os identificaria definitivamente como cúmplices da classe exploradora.

O postulado central destes comentários (a derivação do planeta em direção à ditadura global) é factível segundo as condiciones de uma globalização com expansão de capitais produtivos e financeiros, que tem sido acompanhada pela ridicularização do estado de direito, doce escravo de um grupo reduzido de sujeitos com poder econômico e pela escalada das chamadas guerras preventivas impulsionadas pelos EUA.

José Miguel Arrugaeta em seu artigo A crise da divisão do mundo “made in USA” refere-se a:

“A coerência e agressividade dos EUA a partir do 11 de setembro obedecem à simples lógica de se repartir o mundo de acordo com seus interesses e o das multinacionais, o final planejado deveria ser uma Pax Americana para várias décadas, onde controlem as principais reservas estratégicas de recursos naturais e biológicos, exerçam sua hegemonia política e ideológica no mundo de maneira incontestável, concentrem e administrem o conhecimento tecnológico, e os mecanismos de exploração econômica que lhes permitam transladar um importante fluxo de capital financeiro de maneira permanente desde o Terceiro Mundo em direção ao seu tecido econômico, para manter seu crescimento econômico e sustentar o imenso custo de seu poder mundial”

O caos existente na governabilidade é resultado da ordem econômica imposta pelos poderes hegemônicos que atuam intencionalmente a fim de obter benefícios com a situação, as leis, os direitos, as garantias e o dever de obediência às normas que integram o Sistema Jurídico de uma Nação, sejam operantes, ainda que apenas rotulados para aparentar “democracia”, encobrindo assim a ditadura global. Este rearranjo completa a crescente criminalização dos protestos sociais e sindicais e a nova moda de criar exércitos privados para combater em conflitos armados.

A solução aos graves e grandes problemas que afetam a maioria dos habitantes do planeta não virá sob a bandeira do capitalismo. Serão os povos e os trabalhadores que, exercendo o poder inerente à sua condição de maioria, mudarão o destino da humanidade.

A luta de classes, simbolizada hoje com mais força pela desigualdade abismal entre ricos e pobres, entre os poucos donos e os muitos despossuídos, se traduz atualmente no incremento da ação sindical e social: greves, vigílias, barricadas em estradas, retenção de ações, manifestações e marchas se sucedem em cada rincão do planeta, enquanto que os fóruns e eventos sociais e sindicais servem como marco para avançar na organização da resistência e no impulso de alternativas, apostando-se em muitos destes cenários para a mudança para o socialismo ou pela construção de uma democracia participativa, ampla e soberana, que atue em defesa dos interesses, do patrimônio, dos recursos nacionais e que esteja comprometida com um modelo de integração complementar e solidário.

Entretanto, para alcançar este objetivo é imprescindível consolidar a unidade nacional e a integração dos povos, uma tarefa nada fácil dado que as forças imperialistas se interpõem para boicotá-la e impedi-la, a qualquer preço.

A luta da classe trabalhadora e do movimento sindical classista deve, portanto, basear-se em três pilares:

1. O enfrentamento das políticas imperialistas consumadas ou em vias de implementação.

Este enfrentamento deve ser forjado em cada nação e difundido regional e mundialmente, pois seria ilusória ou, ao menos insustentável, a globalização da luta, sem a unidade das partes que respondem pelo trânsito do particular ao geral.

2. A defesa dos princípios e valores de uma democracia participativa que garanta a estabilidade e o exercício do poder dos Estados Nacionais na instrumentação de políticas públicas e reforce sua soberania, independência e autodeterminação.

3. Reconstruir o direito do trabalho, minimizado pelas políticas desreguladoras do neoliberalismo, recuperando assim seu caráter protetor, o princípio da progressividade e os direitos suprimidos.

4. Modificar as leis que fomentam a inversão estrangeira que idealizam a entrega do patrimônio e os recursos naturais das nações aos capitais externos e que instrumentam a concessão de privilégios às empresas transnacionais para operar em detrimento dos interesses nacionais com total impunidade, incluindo a depredação selvagem ao meio ambiente.

5. Anular as normas jurídicas que criminalizam os protestos sindicais e sociais, limitando a liberdade de expressão, de associação, de manifestação e na ordem mais específica, o direito de greve, ou que sancionem ações coletivas cuja motivação esteja vinculada à defesa dos direitos mais o ementares do homem.

6. Refutar, combater e derrotar os projetos de governança mundial gestados a partir dos organismos multilaterais ou impulsionados pelos eixos de poder sob a roupagem de tratados comerciais ou acordos de associação.

Em contrapartida, é impostergável, no cenário global, reverter o caráter antidemocrático dos organismos multilaterais, cujas decisões conduzem atualmente a humanidade à instalação de uma ditadura mundial orientada por uma pequena plêiade de mestres do tartufismo proselitista da “governança mundial”.
                   
A defesa da autodeterminação e da soberania dos povos e a luta pela paz, constituem, propósitos vitais para enfrentar a hegemonia imposta pelo “smart power” ou pelas guerras.

A integração é uma missão transcendental dos povos e, para a América Latina, é o único desenlace possível para a libertação definitiva da bota opressora do grande império.

(Fim da Parte II)

[1] Banqueiro de origem alemã Participou da criação do Sistema de Reserva Federal, foi fundador do CFR (Council on Foreign Relations), grupo que desde a sua fundação e até a atualidade projeta e controla a execução da política exterior estadunidense.

[2] Gideon Rachman, muito vinculado ao governo de Israel e aos círculos financeiros da City, além de colunista do The Financial Times.

[3] George Soros, conhecido especulador que conseguiu amealhar uma ampla fortuna. O discurso liberal que defendeu durante a década de 1990 foi se transformando quando se avizinhou a arrebentação da crise. Desenvolve uma una falsa filantropia com a promoção de “sociedades abertas”, destinando grandes recursos para a transformação de sujeitos ou atores sociais que impulsionam suas concepções e compra decisões nos governos.

[4] As verdadeiras intenções que rodeiam os conselhos pós-crises deste último personagem que empregou parte de sua fortuna na subversão e influência nos Estados europeus e latino-americanos com relativos êxitos, são reveladas por Alfredo Jalife- Rahme em seu artigo “O governo Mundial de George Soros. Para acessar o texto completo abra o link abaixo. http://www.jornada.unam.mx/2009/11/01/index.php?section=opinion&article=012o1pol

[5] Para acessar o artigo, entre no link abaixo.

http://www.rebelion.org/noticia.php?id=46888&titular=la-crisis-del-reparto-del-mundo-%22made-in-usa%22-

[6] Publicado pelo FSM em boletim impresso, dezembro de 2008.

[7] A posição da OIT é compreendida nos seguintes comentários de Juan Somavia, diretor-geral da OIT, “Nada do que eu disse se opõe ao consenso alcançado no final do século XX sobre economias e sociedades abertas. Todos nós concordamos que esta é a maneira adequada pela qual devemos agir …. A agenda do trabalho digno da OIT é uma forma realista de combinar o progresso social e eficiência econômica”.

[8] A declaração do Banco Mundial incluiu entre suas determinações, a observância dos direitos fundamentais do trabalho, sem considerar a aplicação aos diferentes níveis de desenvolvimento econômico dos países, a sua capacidade econômica e objetivas condições sociais. Além disso, a UE, em 2007, retirou os privilégios comerciais de Belarus, alegando desrespeito aos direitos fundamentais.

[9]   Códigos de conduta de grandes cadeias de supermercados, multinacionais e grandes empresas que, dentro de um setor, são utilizados tanto para esconder a imagem predatória dos empregadores para minar os sindicatos. A Nestlé e a Coca-Cola foram eleitas no Chile há dois anos, numa pesquisa de Monitoração da Responsabilidade Social Corporativa, como “empresas socialmente responsáveis”, sem dúvida, os mortos não foram consultados, assim como os membros do SINALTRAINAL-COLOMBIA.. 

[10] Proposta apresentada pela OIT para o G-20 para enfrentar a crise e criar postos de trabalho, que se baseia em propostas semelhantes às previstas na Agenda do Trabalho Digno. Conforme aprovado em junho de 2009, Juan Somavia declarou: “Este convênio prevê uma maneira de conseguir isso, é o resultado de contribuições de todos os membros da OIT e com base em políticas já testadas.

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