Mulheres contribuem cada vez mais para “fuga de cérebros” na África, diz estudo

A fuga de cérebros no continente africano até hoje se dava predominantemente entre homens. Embora as mulheres representem quase um em cada dois migrantes (49%), suas migrações costumam ser atribuídas à reunião familiar e diriam respeito a pessoas não qualificadas. Em um estudo intitulado “A emigração das mulheres qualificadas, um componente oculto da fuga dos cérebros africanos”, Abdelslam Marfouk, pesquisador da Universidade Católica de Louvain, na Bélgica, desfaz esses “clichês”.

As mulheres não somente constituem uma ampla parte da migração africana (44%) para países da OCDE [Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico], como mais da metade delas são formadas no ensino superior. O fenômeno quase não é visível na Europa, onde, com exceção do Reino Unido e, em menor medida, da Alemanha e da Áustria, a porcentagem de formadas entre a população de migrantes não ultrapassa os 20%.

Ao contrário da América do Norte e da Austrália, onde mais de 60% das migrantes africanas cursaram o ensino superior. Essa proporção é maior também entre as migrantes da Ásia (44%). A comparação é relativa ao ano de 2000, a única até o momento que permite comparar de maneira válida todos os países da OCDE.

Entre 1990 e 2000, o número de migrantes qualificadas aumentou 73%, passando de 5,8 milhões para 10,1 milhões enquanto, ao mesmo tempo, a porcentagem das mulheres migrantes não qualificadas aumentou “só” 22%. Em todo o mundo, com exceção da África Central, essa proporção foi superior à dos homens. A razão dessa explosão deve-se em parte ao fato de que o acesso das mulheres ao ensino superior aumentou mais rápido do que o dos homens, por recuperação. Em nível mundial, a população das mulheres instruídas aumentou 68% – até 105% nos países menos desenvolvidos – ao passo que a dos homens aumentou 42% (71% nos países menos desenvolvidos).

Reação em cadeia

“Para a grande maioria dos países africanos, o fenômeno de fuga dos cérebros afeta mais as mulheres do que os homens”, afirma Marfouk, que acredita que “as mulheres africanas mais instruídas constituem o grupo mais móbil internacionalmente”.

Em certos países, como a República Democrática do Congo, Nigéria ou Tunísia, o índice de emigração das mulheres qualificadas é dez vezes superior ao dos homens qualificados. Sabendo que a porcentagem de mulheres formadas na África dentro da população ativa é muito baixa (2,4%), pode-se imaginar a dimensão da perda para os países de origem.

Essa emigração pesa sobre os países de origem de forma talvez mais grave do que a dos homens. Pois provou-se que a educação das mulheres é um elemento essencial do desenvolvimento, com reação em cadeia sobre a mortalidade infantil, educação das crianças e sua saúde. Além disso, “mesmo que de forma geral elas sejam menos bem remuneradas do que os homens migrantes, as mulheres transferem uma proporção maior de sua renda para os países de origem”, garante Marfouk.

O exemplo do Marrocos é prova disso: a contribuição das marroquinas que emigraram para um país da OCDE representa 5,4% do Produto Interno Bruto (PIB) desse país onde 11% da população vive em uma família beneficiada por uma transferência. E entre essas migrantes, 20% são formadas, contra 18% dos homens, segundo Marfouk.

O Marrocos, que há três anos possui um Conselho Consultivo dos Marroquinos no Exterior, criou um “grupo de trabalho sobre a questão do gênero”. Coordenado por Amina Ennceiri, que trabalha na Agência Francesa das Migrações Internacionais, nesses dois últimos anos ele se empenhou em reunir essas marroquinas de todas as idades e grupos sociais.

“Cada vez mais mulheres partem sozinhas”, diz Ennceiri. “Elas se tornam de fato chefes de família. Sua influência é, portanto, preponderante para o Marrocos”. Entre elas, há cada vez mais formadas, confirma. Mas para o Marrocos, assim como para o resto da África, o fenômeno atinge mais os países árabes ou o Líbano, por exemplo, do que a Europa.

Fonte: Le Monde

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