RESTREPO e o circo americano na Guerra do Afeganistão

A primeira imagem do filme mostra o que parece ser um bando de adolescentes em férias fazendo bagunça num trem. Não é. Na verdade são soldados do exército americano a caminho da guerra no Afeganistão. São jovens do 503º Regimento de Infantaria e Combate Aéreo que estiveram nas montanhas afegãs, entre 2007 e 2008, diante das câmeras dos cineastas Tim Hetherington e Sebastian Junger, diretores do documentário Restrepo.

E vem a pergunta: o que teria de novo a mostrar mais um documentário sobre guerra? Garotos despreparados entrando em pânico diante da morte? Balas zunindo sobre as cabeças? Momentos de música, descontração e saudades de casa? Ou a incontestável mensagem que toda e qualquer guerra é, por si só, estúpida e sem sentido? Sim, o filme tem tudo isso. E mais um pouco: a certeza de que os EUA montam um circo (ou seria uma Disneylândia?) tão eficaz para enganar sua população que nem sequer os soldados rumo à guerra têm ideia do que vão encontrar.

Eles se crêem imunes, vencedores antes da batalha, inatingíveis na condição de defensores mundiais da liberdade. Chamam os adversários de “bad guys”, o equivalente a “bandidos” na expressão “mocinhos e bandidos”. E não sem motivos, quando a realidade se apresenta sem retoque, eles custam a crer que o mundo não é um parque temático. A lona das listras e estrelas cai por terra e os verdadeiros palhaços ficam nus.

Chama a atenção a fala de um dos garotos, que diz ser fazendeiro. Seu colega pergunta se é uma fazenda com galinhas, vacas e porcos. A resposta é negativa: trata-se de uma fazenda de “terra, caminhões e armas para matar animais”, ele diz. No mínimo, coerente: no país mais bélico do mundo, há fazendas onde a atividade principal é a matança.

Outro garoto, este com semblante ainda mais jovem, diz que era filho de hippies, no interior. E que seus pais proibiam armas de brinquedo. Não adiantou. Este mesmo rapaz se lamenta, durante o filme, por não estar mais próximo do inimigo, para que ele pudesse ter o prazer de vê-lo em pedaços, após um tiro certeiro.

São estes os herois da nova ordem mundial. Garotos quase imberbes que se deslocam para o outro lado do planeta e repetem os mesmos padrões de violência e suposta liderança mundial que seus bisavôs, avôs e pais já cometeram na Primeira Guerra, na Segunda, na Coreia, Vietnã, Afeganistão ou Iraque. Só muda o palco: a farsa é a mesma de sempre.

Se o filme tem algum mérito, é fazer pensar sobre este interminável ciclo da morte. Restrepo foi o vencedor do Grande Prêmio do Júri no Festival de Sundance 2010.

Fonte: Cineclick

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