Os perigos da aliança com exploração capitalista

Os exemplos que, a seguir, estarão citados neste texto talvez não se traduzam a trabalhadores de algumas regiões do país, mas podem servir de reflexão a  alguns que se dizem representantes da classe trabalhadora. Em evidência, está a “nova” proposta de alteração da legislação trabalhista no Brasil, apresentada por um importante sindicato.    

Para começar, é importante trazer à tona fatos corriqueiros no cotidiano daqueles que fazem deste país um dos mais importantes no atual cenário mundial: os trabalhadores.

Em reunião no interior de uma fábrica, a empresa exigiu que os trabalhadores pressionassem os dirigentes para que o Sindicato renovasse um acordo que havia sido denunciado pelo Ministério Público do Trabalho, prevendo a redução do intervalo para refeição para 40 minutos. Os sindicalistas foram humilhados, xingados, agredidos moral e fisicamente pelos trabalhadores que representavam e o atual presidente da entidade teve um dente quebrado.

Nessa fábrica, é comum a proibição à livre associação ao Sindicato, com ameaças no ato da admissão, até porque esta apenas é feita através da indicação de um parente ou amigo, já que o admitido fica sob “tutela”.

Comum também é a chefia, quase sempre em grande número, ficar posicionada estrategicamente nos restaurantes para impedir qualquer tipo de manifestação dos dirigentes em período de negociações que envolvam os trabalhadores. Além disso, há uma rotatividade intensa da mão-de-obra, de maneira que a insegurança impõe limites exagerados no que se refere à preservação do emprego.

As famílias dos trabalhadores desconhecem o ritmo imposto pela produção, mas se envolvem no marketing midiático, segundo o qual “é importante trabalhar numa grande multinacional”. Assim, tome mais pressão para manter o emprego, agora, inclusive, vinda daqueles que são o principal apoio de qualquer trabalhador.

O aparato militar sempre à disposição para garantir o livre direito da empresa em não ter nenhum problema, sobretudo com possíveis ações do Sindicato ou de reunião dos trabalhadores. Até como escolta dos ônibus especiais já foram utilizadas dezenas de viaturas, “sempre ao inteiro dispor”, tudo conforme aquilo que for necessário para o funcionamento das linhas de produção.

Além disso, surgem milícias, até armadas, preparadas para seguir carros de dirigentes do Sindicato e às margens da rodovia em todos os horários de trocas de turnos – que interferem, inclusive, no trânsito (em caso de engarrafamento) para garantir o just in time sem atrasos.

Em ações trabalhistas, essa empresa a que nos referimos, no início do século 21, só perde, em volume de processos, para o Banco do Brasil e para a Caixa Econômica Federal, certamente porque esses bancos públicos acumulam grande passivo no fim do século 20.

O processo de adoecimento é crescente nessa fábrica. Os trabalhadores que conseguem afastamento via INSS (cada vez mais raro), ao retornarem, às vezes, nem conseguem gozar a estabilidade no emprego (Lei 8213). São colocados no “olho da rua”, marginalizados, com dificuldades de obterem novo emprego, e a sociedade vai assumindo o custo desta “chacina fabril”.

NÃO faltar, NÃO reclamar, NÃO se associar, NÃO ler jornal do Sindicato, NÃO conversar com sindicalistas, NÃO se aproximar do carro de som da entidade, NÃO deixar de fazer horas extras, NÃO participar de assembleias…imagina pensar em fazer greve…

É neste contexto que afloram propostas como a que prevê que o “negociado” prevaleça sobre o “legislado”, o que, em última instância, poderá resultar na redução do alcance da proteção social aos trabalhadores, como previsto na Constituição Federal de 1988 e na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Ao admitir a pretensa autonomia para a negociação direta entre empregadores e trabalhadores, a corda poderá, mais uma vez, arrebentar do lado mais fraco, ou seja, os operários, uma vez que já está claro que a relação entre as partes é desigual.

Precisamos considerar, ainda, que, dada a extensão do nosso país, as exceções não podem ser tratadas com regra – ou seja, hoje, os que defendem as mudanças são uma ilha numa em realidades muitos distintas entre os trabalhadores.

Senhores dirigentes sindicais, parlamentares (deputados e senadores) que querem a ”modernidade” nas relações de trabalho no Brasil: não fiquem de joelhos contribuindo para mais essa espoliação do operariado nacional.

As prioridades da luta sindical devem ser o crescimento do país com valorização do trabalho; a redução da jornada para 40 horas semanais; a defesa da Convenção 158 da OIT (contra a demissão imotivada); a defesa do contrato coletivo nacional (padrões iguais, direitos diferentes); a democratização no local de trabalho, com repartição do poder diretivo.
É necessário combater os desvios de classe do sindicalismo brasileiro!

Por fim, é importante agradecer e recomendar o texto dos professores da PUC Minas, Márcio Túlio Viana e Maíra Neiva Gomes, intitulado “O negociado sobre o legislado II: a aventura continua”, pelos elementos que trouxeram à reflexão. Este texto está disponível na internet, no endereço http://www.conpedi.org.br/anais/XXcongresso/Integra.pdf.   


Marcelino da Rocha é presidente da FIT Metal e diretor de Imprensa licenciado do Sindicato dos Metalúrgicos de Betim e Região (MG)

 

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.