Economia sem platonismo

Pense nessa situação. Nos últimos sete anos, o Produto Interno Bruto (PIB) de seu país caiu cerca de 25% e as previsões de crescimento da economia para 2015 não são animadoras: apenas 0,5%. A situação é ruim para a população em geral, mas é mais crítica para os menos experientes: mais de 52% dos jovens estão sem emprego. E não é só: 45% dos aposentados são pobres e, segundo a Unicef, 40% das crianças não têm supridas suas necessidades nutricionais mais básicas. O governo já cortou 200 mil funcionários da sua folha de pagamento, mas mesmo assim parece não ter jeito.

Era nessa situação que a Grécia se encontrava no início do ano, quando Alexis Tsipras, do partido Syriza, foi eleito primeiro ministro. Tentou, em vão, negociar com a União Europeia, o FMI (Fundo Monetário Internacional) e o Banco Central Europeu. Mas os credores exigiam do governo novos cortes de gastos. Convocou, então um plebiscito em que mais de 60% dos gregos votaram “não” ao plano europeu de conceder novos empréstimos em troca da imposição de novas medidas de austeridade.

Todavia, a Grécia receberá um terceiro pacote de resgate, no valor de 86 bilhões de euros, além de um reescalonamento de sua dívida externa, em troca da implementação de uma série de reformas de austeridade, o que inclui a privatização de muitos setores de sua economia. Capitulação?

Talvez sim, talvez não. O fato é que a experiência grega nos leva a refletir que nenhum país pode ser uma ilha ao enfrentar o sistema financeiro internacional. Ações conjuntas dos bancos internacionais de recrudescimento requerem ações conjuntas dos trabalhadores e governos progressista para construírem alternativas para um mundo mais justo e igualitário. O cerne é somar esforços, principalmente de todos os países europeus aviltados pelas políticas econômicas capitaneadas por Berlim, para enfrentar esse “outono austero”.

Dentro desse prisma, o papel da classe trabalhadora em todo o mundo não pode ser ignorado. Na própria Grécia, a combatividade de organizações como o PAME (Frente Militante de Todos os Trabalhadores, na sigla em grego) merece o reconhecimento de todos os que estão comprometidos com a luta contra a austeridade. Os trabalhadores não podem pagar a conta de uma crise criada pelo capitalismo e pelo sistema financeiro internacional.

“O passado da Alemanha, neste contexto, deveria ter um grande significado para os alemães de hoje. Olhe para a história das dívidas nacionais: Reino Unido, Alemanha e França já estiveram na mesma situação da Grécia atualmente, e eles já estiveram até mais endividados. A primeira lição que podemos tirar da história do endividamento governamental é que nós não estamos enfrentando um problema novo. Há muitas formas de pagar dívidas, e não apenas uma que Berlim e Paris quer que os gregos acreditem”, disse o badalado economista francês Thomas Piketty, autor do livro O Capital no Século 21, em recente ao jornal alemão Die Zeit. “O que me afetou justamente quando eu estava escrevendo [seu último livro] é que a Alemanha é realmente o melhor exemplo singular de um país que, no decorrer de sua história, nunca pagou sua dívida externa. Nem depois da Primeira ou da Segunda Guerra Mundiais”.

A solução? Para Piketty, é renegociar toda as dívidas, não só da Grécia. “Temos de organizar uma conferência sobre todas as dívidas da Europa – como foi feito depois da Segunda Guerra Mundial. Uma reestruturação de toda a dívida, não só da Grécia, mas de vários países europeus, é inevitável”. A Grécia pode ter perdido uma primeira batalha na renegociação de sua dívida, mas com certeza pode ter servido como exemplo de que somente com uma ação internacionalista se pode fazer mudanças contra o sistema financeiro internacional. Ou seja: para acabar com a dicotomia entre o mundo material (políticas de austeridade) e o mundo ideal (renegociar justamente sua dívida), é necessário parafrasear a frase de Marx: “endividados de toda a Europa, uni-vos”.

Francisco Sousa é secretário-geral da União Internacional Sindical dos Metalúrgicos e Mineiros (UIS MM) e secretário de Relações Internacionais da Fitmetal.

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