Durante sua participação na abertura do 3º Encontro de Comunicação da Rede CTB realizado nesta quarta-feira (15), Camila Modanez trouxe uma abordagem provocadora e didática sobre o uso da inteligência artificial (IA) na comunicação. A especialista diferenciou conceitos fundamentais e destacou a importância de uma visão crítica e estratégica sobre as ferramentas digitais que moldam o atual cenário da informação.
Diferenciando conceitos: automação, algoritmo, IA, IA generativa e agentes de IA
Camila iniciou sua fala destacando a necessidade de diferenciar termos frequentemente tratados como sinônimos no debate sobre tecnologia e comunicação. “A gente acaba colocando tudo no mesmo balaio — e não é”, explicou.
Segundo ela, automação é quando um sistema realiza tarefas pré-programadas automaticamente, a partir de gatilhos, como o envio de mensagens por bots. Já o algoritmo é um conjunto de regras matemáticas que define o que será exibido, muito comum nas redes sociais.
A inteligência artificial (IA), por sua vez, é capaz de aprender com dados e tomar decisões simples, como recomendar produtos ou detectar fraudes. A IA generativa, como o ChatGPT e o Gemini, vai além: aprende com grandes volumes de dados e gera conteúdos inéditos. Por fim, os agentes de IA são combinações dessas ferramentas, capazes de executar tarefas mais complexas — e já vêm transformando a comunicação digital.
Podemos confiar na IA generativa?
A pergunta sobre a confiabilidade da IA é recorrente, e Camila foi direta: “Não dá para confiar 100%”. Isso porque essas ferramentas aprendem com o que está disponível na internet — e isso inclui uma base de dados marcada por hegemonias e ausências.
“Se a IA não foi alimentada com Paulo Freire, ela não vai responder com base em Paulo Freire”, exemplificou, reforçando a importância da interpretação crítica frente às respostas das IAs.
A IA está moldando a forma como nos informamos
Mais de 50% das pessoas já recorrem a ferramentas como ChatGPT em vez do Google. Isso muda completamente o jogo da informação. “A IA não está só criando conteúdo. Ela está informando as pessoas”, alertou Camila. Daí a importância de entender quais referências alimentam essas respostas e quais vieses estão embutidos.
O uso prático da IA na comunicação: automações, orquestrações e agentes
Na prática, o uso da IA pode transformar o cotidiano das equipes de comunicação. Camila citou ferramentas como N8N e Bardeen, que realizam orquestrações automatizadas, otimizando processos como publicações em blogs, SEO, geração de imagens e redimensionamento de arquivos.
Ela alertou que setores mais estruturados, especialmente o mercado privado e a direita política, já dominam esse uso sistemático. “A gente precisa aprender com isso”, afirmou.
Como agentes de IA podem potencializar nossa atuação política
A tecnologia pode também ser uma aliada na análise política. Agentes de IA já conseguem analisar debates parlamentares, sistematizar transcrições, identificar trechos relevantes e ajudar na construção de estratégias.
“Podemos automatizar clipping, acompanhar notícias em tempo real, filtrar conteúdos — isso tudo fortalece a nossa ação”, explicou. Ela prevê, inclusive, que a IA terá papel central nas eleições de 2028.
A IA como ferramenta estratégica (e não substituta do pensamento crítico)
“Negar a IA é se distanciar do mundo”, disse Camila. Para ela, é preciso usar a IA com clareza de propósito político, como um braço estratégico, e não como substituto do pensamento crítico.
Ela comparou com o debate sobre telemedicina, que no Brasil girou em torno de sua validade, enquanto outros países a usaram para garantir acesso à saúde. “É esse tipo de uso que precisamos fazer com a IA”, destacou.
O jogo desigual e o uso crítico das ferramentas
Camila também fez um alerta sobre o jogo desigual entre grandes estruturas e organizações populares. “Nunca teremos o mesmo poder de investimento, mas podemos usar as mesmas ferramentas com nossos objetivos”.
A estratégia, segundo ela, está em usar essas tecnologias com consciência e finalidade política, mesmo quando o acesso técnico ainda é limitado.
A IA não é neutra: ela reproduz o sistema dominante
Outro ponto crucial da fala foi o caráter não neutro da IA. Camila comparou com a estatística: “Números só são confiáveis até a página dois. Se a base for enviesada, o resultado não representa a realidade”.
O mesmo se aplica à IA. Ela reforçou que não se trata de recusar a tecnologia, mas de compreendê-la para usá-la com criticidade e consciência.
IA como parceira na organização de ideias
Camila também compartilhou como utiliza IA no dia a dia, principalmente na organização de estratégias de comunicação. Mas deixou claro: a IA só funciona bem quando bem direcionada.
“Se você disser para a IA quem você é, o que pensa, qual sua base política e quais referências quer usar, ela pode ser útil. Senão, vai simplesmente reproduzir o sistema”, afirmou.
Conclusão: criticidade no uso da tecnologia
Para encerrar, Camila deixou uma provocação: “Não importa só a ferramenta que usamos, mas para onde estamos apontando ela”. E finalizou com um convite à reflexão: “Uso essas ferramentas com consciência. Sei que são extensões de interesses dominantes, mas sei onde e por que estou usando. E é essa a provocação que queria fazer aqui sobre a comunicação”.
Camila Modanez - Apresentação CTB 150525