Ao falar em “uso da força” para manter eventual indulto concedido ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), em caso de vitória da direita nas eleições de 2026, o senador Flávio Bolsonaro advogou, explicitamente, o recurso ao “golpismo”. A avaliação é do ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal Celso de Mello.
O ministro aposentado do STF comentou as declarações de Flávio Bolsonaro em entrevista à Folha de S. Paulo
“O golpismo, agora, é advogado explicitamente, sem qualquer pudor, pela família Bolsonaro! Indulto ou anistia, nem que seja pelo ‘uso da força’. Em outras palavras, a obtenção desses benefícios constitucionais deve ser conquistada à outrance, a qualquer preço, por todos os meios, mesmo que isso signifique golpear as instituições democráticas”, disse o magistrado à revista eletrônica Consultor Jurídico.
A declaração foi dada ao comentar a entrevista que o senador e filho mais velho de Bolsonaro, Flávio Bolsonaro (PL-RJ), deu ao jornal Folha de S.Paulo.
No texto publicado no sábado (14/6), o congressista afirmou que, para receber o apoio do ex-presidente na próxima corrida presidencial, o candidato precisa se comprometer a conceder indulto ao seu pai — caso ele seja condenado pela trama golpista que resultou nos atos de 8 de janeiro de 2023. Mas não só isso: o aspirante a sucessor da direita deve estar disposto a brigar com o STF se a corte reconhecer a inconstitucionalidade da medida.
“Bolsonaro apoia alguém, esse candidato se elege, dá um indulto ou faz a composição com o Congresso para aprovar a anistia, em três meses isso está concretizado, aí vem o Supremo e fala: é inconstitucional, volta todo mundo para a cadeia. Isso não dá. Certamente o candidato que o presidente Bolsonaro vai apoiar vai ter que ter esse compromisso, sim”, disse Flávio Bolsonaro ao jornal.
“É uma hipótese muito ruim, porque a gente está falando de possibilidade e de uso da força. A gente está falando da possibilidade de interferência direta entre os Poderes. Tudo que ninguém quer. E eu não estou falando aqui, pelo amor de Deus, no tom de ameaça, estou fazendo uma análise de cenário. É algo real que pode acontecer”.
Desonrar a Presidência
Para Celso de Mello, aceitar a condição imposta pela família Bolsonaro para receber o apoio do patriarca seria um ato de “desonra”.
“Algum presidente estaria disposto a desonrar-se, pessoal e politicamente, vilipendiando a Constituição da República, somente para aplacar o inconformismo e o sentimento de ódio dos Bolsonaros e para satisfazer-lhes a exigência de impunidade do Jair?”, questionou.
O ex-presidente do Supremo avalia que tal exigência coloca os interesses de Bolsonaro acima da Carta Magna.
“A conveniência pessoal e particular de Jair Bolsonaro estaria, agora, sendo elevada a um patamar superior ao da supremacia e integridade da lei fundamental da República? A tanto chega a pretensão da família Bolsonaro: fazer “uso da força” para conseguir e tornar irreversível a concessão da indulgentia principis? Parece que sim!”, observou o ministro aposentado.
Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasi