A insuficiência do discurso econômico

Há tempos venho alertando para a insuficiência do discurso público do Ministro da Fazenda Guido Mantega. Está-se em uma fase crucial da economia. Há mudanças estruturais profundas e o desconforto daí decorrente, a dificuldade da retomada do crescimento e, ao mesmo tempo, os efeitos da crise econômica global.

Sem o discurso eficiente por parte da autoridade econômica, abre-se espaço para uma atoarda ampla, na qual as dúvidas dos agentes econômicos são potencializadas pelo choro dos prejudicados pelas mudanças.

Por exemplo, atribui-se a falta de investimentos à insegurança da economia devido ao excesso de intervencionismo do governo. Ora, todas as intervenções têm sido no sentido de melhorar o ambiente econômico. Se existe uma lógica na ação, onde a insegurança?

As dúvidas que seguram os investimentos são muito mais comezinhas. O “pibinho” de 2012 lançou dúvidas sobre a capacidade de recuperação da economia. Tendo dúvidas sobre a demanda futura, o empresário segura os investimentos e trata de aumentar marginalmente sua produção, até ficar claro que a capacidade ociosa existente será efetivamente completada.

O problema maior tem sido a hiperatividade da Fazenda, lançando dúvidas sobre as contas públicas. Aí entra a dubiedade do discurso de Guido Mantega. No início do ano, havia uma corrente defendendo a redução do superávit fiscal. Mas Guido insistiu na manutenção da meta de superávit para não dar espaço para as críticas do mercado. Era um contrassenso.

De um lado, estava clara a mudança nos paradigmas da política econômica, priorizando os investimentos. Tinha-se sob controle o principal indicador de desempenho fiscal – a queda sistemática da relação dívida líquida/PIB. Tinha-se uma economia patinando, o que justificaria uma ação contracíclica. E tinha-se a redução da Selic reduzindo o serviço da dívida.

Em suma, a política econômica passou a ter orelha de coelho, focinho de coelho, pata de coelho, mas Guido teimava em continuar chamando-a de gato.

No terceiro trimestre, quando houve a frustração da arrecadação fiscal, o governo estava amarrado à meta fixada na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias).

Tinha-se, então, duas alternativas: ou mandava uma nova lei ao Congresso, reduzindo a meta de superávit; ou recorria à chamada “contabilidade criativa”.

Decidiu-se pelo segundo caminho. E a tarefa foi entregue ao Secretário do Tesouro Arno Augustin, um tecnocrata arrogante que não se julga na obrigação de se explicar para ninguém.

As medidas foram tomadas no fechamento de 2012 sem que nem Augustin nem Guido se preocupassem em justificá-las ao distinto público. Há toda uma literatura no FMI defendendo medidas contábeis pontuais para fechar as contas. E uma lista de argumentos defensáveis. Deixou-se tudo de lado.

Agora, o principal consultor do governo, ex-Ministro Antonio Delfim Netto, escreveu um artigo arrasador sobre a “contabilidade criativa”.

Delfim fala de cátedra. Em 1979 quando as contas externas foram arrebentadas pela crise do petróleo e juros, recorreu a um amplo estoque de artifícios que pretendia passageiros. No final do governo Figueiredo, o passageiro tinha se transformado em uma barafunda orçamentária que destruiu a credibilidade da política econômica.


Luis Nassif é jornalista. Artigo publicado originalmente em seu blog.

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